viernes, 14 de marzo de 2014

AGARRAR-SE A UMA ESPERANÇA DENTRO DO ABSURDO

A caneta voou à boneca e Jonás agarrou-a com força.

“Ao julgar por teu aspecto dizer-se-ia que não vens de bem longe quando te vejo através destas fotos que a mim me fazes chegar…; no entanto, são mil quilómetros os que nos separam. Que bem deves de te estar a passa-o pelo litoral, amor meu!. Já sabes que eu não duvido de tua fidelidade para comigo. Seguimos compartilhando estes jogos românticos de cartas que nos fazem sentir mais primitivas e primitivos, e dentro do selvagem que há no primitivo somos felizes por estar vivos e vivas… Que ditosa é a felicidade em primavera quando há uma janela pelo médio..., e sabes que a podes abrir! .. E um elevador que te pode baixar…, e passear pela grande avenida… Eu com essas pequenas coisas me conformo. Ti já o sabes... Ti já o sabes bem, Inauldiwa! Ti e Rebecca  ficareis muito satisfeitas, pois fazia tanto tempo que não vos vísseis que agora estareis as duas semanas primeiras dedicadas tão só a recordar as coisas que juntas vivestes na infância e a adolescência. Recordareis entre outras coisas como ao ir ao colégio pelas manhãs o orvalho que gelava as falanges dos dedos fazia que vossas mãos se entrelaçasem, enquanto pequenos filamentos de vapor se deslizavam para a boca do vulcão labial, e assim desprender um jato de vida gasosa manufacturada ...Todas esta s coisas são as coisas bonitas da vida, pois estas coisas são as que lhe dão sentido e não outras..., Tudas estas coisas  há que as contar! Julia aqui cresce com força e Alvarito está já feito um homem.

Chamam à porta!, chamam à porta estrondosamente. Toc, toc e toc...e depois outra vez toc, toc e toc

-Senhor Jonás, é um telegrama para Você...!

- Agora não!, Zanguito, agora não!, que  estou comprometido numa carta de amor. Agora não, Zanguito...!

- Embora… Verá, Senhor Jonás!. A questão é …, a questão é de dizer também que Alvarito não quer subir...

Jonás levanta suas pousadeiras da cadeira de mogno, e com voz agora mais rouca se arranca o bigode, ao mesmo tempo em que se dirige para a porta.

- Que Alvarito não quer subir?

Abre a porta violentamente Jonás. Assusta-se Zanguito!

- Apanhei-te!...ah, ah, ah...Caçoa depois da brincadeira Jonás; isto é…, seguindo a piada

-Mas..., que susto me deu ,Senhor Jonás... Um dia..., um dia vai você com estas coisas a acabar comigo! Faça-se cargo..., eu já sou maior para estes jogos...

- Quantos anos tens, Zanguito?

-Noventa e sete...

 -Pois em tua honra devo dizer que por ti não passam os anos, e em tal caso é o que a mim me pode levar a me confundir, crendo de modo que é você um colaborador de nossa espécie adulta que frisa os sessenta. A partir dessa idade, quem como a mim gosta deste jogo da algaravia surpreesiva deve ter em conta o coração das nobres gentes...

-Bom..., a verdade é que lhe ouvindo a você, senhor Jonás, um se reconforta depois de tais pequenas maldades tão divertidas...

- Zanguito, alegra-te!, pois por esse caminho chegarás aos cento quarenta e três

-Isso espero, Senhor Jonás, isso espero...

-Espere você, Zanguito, espere...

Enquanto isto dizia, Jonás dava uma volta de trezentos sessenta graus a pequenos saltinhos, cantarolando essa eterna canção de cantando baixo a chuva. Ia como se fosse um pequeno helicóptero de brinquedo em diferentes fases de nivelação, se é que existe tal coisa, pois em caso de existir seria o mais parecido a seu espírito brincalhão naqueles momentos. Até que chegou assim à vitrine de madeira de teca, situada na parte  da sala com remate onde nunca chegava o Sol. Da família Lamiacea, a Rainha das Madeiras. Poderosa Afrodita! Amiga dos minerais! Decadente!..., e quanto mais velha mais bela por ser sábia! Abriu com delicadeza a porta vertical e com chave banhada em ouro. Dela com sumo cuidado pegou o humidor de charutos. Com as duas mãos...; como se fosse a matéria a sustentar a de uma criança em constante poder de germinação, para ato seguido abrir a tampa maciça, que assim, e pelo efeito de sua densidade compensa o equilíbrio nas relações de importância. Comprovar a fixação do higrómetro foi todo depois num, e com gesto de devoção católica assim o interpretou. Colocou o humidor sobre a mesa ratoeira com teto de cristal e olhou ao céu, tampado neste caso o céu pela inconveniência de um falso teto..., que é o que em realidade via..., claro está!.

- Tome um havano! Fume você!...,meu caro amigo... e servidor Zanguito...

-Para não fazer feio...fumarei...

-Ah, malandragem de ser!..., ah, ah...você..., ah, ah...com o que gosta  você dos charutos...Mas, tome..., tenha...Embora..,  espere...!. E levou-se a mão esquerda à cintura para desancorar da presilha da extrema-direita o chaveiro de prata fina que servia de cortador, e se pôs a fareja-o como se fosse Jonás um pequeno pequinés. Algo sem sentido - Já está!..., mas..., tome!, pegue você!, pegue o cortador...Decapite você!, ah, ah...decapite...-dizia agora Jonás ao mesmo tempo que apanhava um dos charutos e o cheirava como se fosse ele, Jonás, uma pequena marmota brasileira-

-É você todo um artista, meu senhor! Farejar os charutos e também o cortador...

-Ah, ah, ah... Bem sabes apreciar as coisas boas...Antes de decapitar cheirar, igual que antes de fumar. Ah, ah, ah...! Tudo concorda…; embora…, dá-me, dá-me esse telegrama então...

- Mando-lho em avião de papel de última geração, como outras vezes…, ou prefere desta vez lhe dar um toque mais diplomático e formal... ? Uma forma em bolinha esférica que recorde à terra, ou um toque de caráter reverencial que decore tão excelsa figura a sua, qual que parece etérea?

-O telegrama da ilusão. Dá-mo tal qual..., ou melhor..., abre-o e dize-me o que diz

Abriu o sobre do telegrama Zanguito mordendo o extremo que se fixa em sua parte Oriental superior e se deslizar assim uma atira de papel a ligeira mordida  manufacturada , que como sua dentadura viajava para Occidente … Como faz o Sol!..., girando..., ainda que sem dentadura nem papel…, o Sol!..., mas desprendendo calor. Estendeu o papel e leu em voz alta, então:

“Chego em breve. Estou bem perto. Sento-te já quase a meu lado! . Michu está muito feliz também”. Em fim... Isto é o que diz o telegrama! O lugar de origem e a pessoa que remetem são tudo em uma....; embora! , que é esse ruído? -dizia assim Zanguito enquanto através do cristal se observava a uma pomba que no peitoril aninhava e debicava o sólido e frio cristal- Oh! quer entrar já a pomba...,Faço-a passar?. O telegrama é de sua amiga..., Gönül Levi Fuat-Özkan, a simpática jovem de Esmirna que...

- Ahhh! –Interrompe Jonás a Zanguinho, ao mesmo tempo em que dirige-se à janela - Gönül Levi Fuat-Özkan e Michu, Michu e Gönül Levi Fuat-Özkan...

-Um gato Van turco e uma mulher turca, uma mulher turca e um gato Van turco.

Efectivamente....Assim é, meu caro senhor Jonás...Algo comovente…, certamente...

Um casal de pombas construiam seu ninho no peitoril da janela costumbrista. Jonás abriu a janela e uma pomba foi a parar ao ombro esquerdo de Jonás e a outra ao ombro direito de Zanguito. Jonás apoiou suas duas mãos sobre o peitoril e berrou:

“Sairei desta prisão e em Alvarito e Julia centrar-me-ei, e para ela e ele virar-me-ei... ”

E justo nesse momento é quando Zanguito decapita o charuto...

- Mas..., e falando de Alvarito.... Não o vejo abaixo! Não está a jogar no pátio com os demais! Oh, Alvarito!, ti que em todo um homem te convertes-te... Onde estás? Faz favor, Alvarito! Sou teu pai, Alvarito! E Julia..., minha cara filhinha Julia. Faz já muito tempo que não vem por aqui! .

O caso é que nesses momentos em Jonás se estava a produzir uma profunda transformação. Agora chorava Jonás desanimadamente, enquanto as duas pombas se lançavam em frenético voo para o exterior.

-Acalme-se, meu caro colega Jonás! –dizia Zanguito ,com voz afetada de voz  de um colega de rota de um verdadeiro tempo adquirido em tais circunstancias-. Não se deixe levar agora pelas emoções!. Não se aflita você neste mundo mais do convindo, e ainda que Inauldiwa lhe tenha abandonado, ainda que Julia não possa agora lhe entender, e Alvarito prefira ir-se com seu abastados tios da grande maçã metropolitana.... E se de algo lhe serve, eu a ninguém tenho aí afora que me vá receber, e isso sim que... Embora... Quantos anos tens, Jonás?

-Bem é certo o que dizes... Treze anos quando aqui entrei, dois menos dos que tem Alvarinho..., mais vinte anos, -fala agora Jonás um pouco mais acalmado-. Por conseguinte, e falando agora de teu a teu à Junta de Tratamento, eu digo:  – ao mesmo tempo em que falava, dirigia seu dedo índice à comitiva penitenciária- , que não pensem vocês que por estar nesta situação um se dobrega com maior facilidade a representar uma pretendida, por sua confederação, falsa sumisão para com vocês nesta obra, que é a definitiva.Vós sois culpables por jogar ao gato e ao rato!

- Trinta e três, como dizem aos de Cristo no morrer!-sentença Zanguito-

- Isso é!, meu caro amigo...!

-Genial!. Talvez não, Arguimiro ? –dizia agora a directora da Junta de tratamento, Solidão da Rivera Pozuelos

Quem também se estava a fumar um charuto havano, ao igual que o recluso Zanguito, era o Juiz Central de Vigilância Penitenciária Arguimiro Cifuentes das Rozas e Mendoza, que agora deixava entrever um sorriso sarcástico, ao mesmo tempo em que jogava com a cinza do charuto ao jogo do equilíbrio. Um sorriso que deixa entrever uma sinal de admiração para o mérito da vizinha ou o vizinho.

- Eu, ainda que não tenha os noventa e sete em que antes nesta obra se argumentava, tenho cinquenta e quatro...-continuava Zanguito

- E é que há obras que rejuvenescem!- por toda a resposta Jonás-

- Genial!. –dizia agora admirado o Juiz Central de Vigilância Penitenciária Arguimiro Cifuentes das  Rozas e Mendoza- Realmente magistral!, se não fosse por esse incidente do dedo índice...

Por conseguinte, acompanhava-lhe ao Juiz Central de Vigilância Penitenciária Arguimiro Cifuentes das  Rozas e Mendoza, a directora da Junta de tratamento Solidão da Rivera Pozuelos e outras personalidades entre as que se encontrava a trabalhadora social a cargo dos dois amigos, Jonás e Zanguito, que compartilhavam cela e programa de tratamento específico, a sicóloga Virtudes Alegres Puertollano, quem se distraia limándose as unhas dos pés.

-Eu não vejo nenhuma incidentalidade, senão um objecto de livre expressão -dizia agora a sicóloga Virtudes Alegres Puertollano, ao mesmo tempo em que deixava a lima sobre um velho jornal bolorento.

E soou o timbre do recreio. Esta sessão estava a desenvolver-se na própria cela. Tratava-se da última sessão, e duma peça artística. Que os dois reclusos realizassem uma obra que lhes desse os suficientes méritos, os já definitivos, e um diploma de condecoração à criatividade do réu... Para passar de um regime ordinário a um aberto e de Inserção Social, de um segundo a um terceiro grau, onde se vai vendo a luz. Vai como quem atravessa esperançada e esperançado o rio... Jonás e Zanguito, dois amigos de módulo, de cela, dois amigos da vida e o presídio

-Quero ouvir falar-lhes algo de sumisão a vocês, um algo de redenção, umas palavras de arrepentimento... -exigia agora o Juiz Central de Vigilância Penitenciária, Arguimiro Cifuentes das  Rozas e Mendoza-

- E uma merda!- estoira Zanguito-

 - E uma merda!- estoira Jonás

 Zanguito, passou um ano mais e morreu de um infarte. Outro ano mais e Jonás passou a regime aberto. Agora está livre. A realidade é que Alvarito, Julia e Inauldiwa nunca existiram. Em tal caso um desejo.
Licencia Creative Commons
Este obra está bajo una Licencia Creative Commons Atribución 4.0 Internacional.